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sábado, novembro 21, 2009

Voo no olhar


É turvo o anoitecer e voluptuoso o mergulho no branco da gaivota. Parece haver passos nas nuvens e uma mão de quase chuva. Porque há-de haver um peixe sempre que falo do rio, não bastará o azul e a areia de construir o mundo, não bastará a palavra na margem para chamar a maré?
Deixo que as estrelas venham na sua navegação geométrica aparecer antes da foz. Podia pendurá-las junto à natalícia lareira, mas a chaminé ainda cheira a enchidos e a tímido eucalipto. Será que as gaivotas e as andorinhas do árctico têm das estrelas os olhos riscados, ou apenas uma láctea mancha de todos os excessos?
Ficaram passos no início da terra e no fim do mar. O que há de mais efémero que esta brisa que vai sempre atrasada para a sua morada mais além? Caiu a onda, como a cabeça no ombro, como uma boca na boca, ou, talvez, como todas as outras ondas. São os olhares que teimam em não ser só olhar que desvirtuam as coisas, que as despem, que as reinventam, é por isso que eu odeio esse olhar mesquinho, manso, míope, que guarda a virtude das coisas. Prostituo-me em cada olhar, como a gaivota que se dá a todo o vento, e não recuso dar-me a um novo horizonte ainda que em toque breve.
É preciso voar, é preciso voar! até que a luz do vento se apague e na tarde mínima o cordame da memória se dilua neste absoluto desejo de sem rumo para todos lados rumar...

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