De tão longe chegam os rumores que ainda os não traduzi
Mas sei que são poucas as palavras que valham a pena repetir
Não houve tempo para puxar o lustro das paredes e fazer janelas
Nem quem quisesse esse trabalho por dois dedos de conversa
E tu sem vires por mais que eu olhasse a estrada antes de curvar
Temi que chegassem primeiro as estrelas e o uivo dos cães
Nada me comove mais que um luar adornado de cães ao longe
Em pequeno esse uivo era mais inteiro e dava-o aos lobos
Tinha uma janela especial por onde via se chegavas e onde surpreendia os
lobos
Hoje não sei o que foi feito dessa janela nem dos lobos cinzentos
Ficou-me uma memória quase tão insegura como a água sem margens
E não sei ao certo se lastimo ou apenas digo o que aconteceu sem inventar
Continuas a não chegar apesar da espera inquieta
E tu sabes como eu me inquieto com as cores, os sons altos e as
margaridas de maio
Saberás agora que tu não estares e deveres estar também me inquieta
É verdade, quando crescemos outras coisas se somam às que nos inquietam
Se chove demais ou o estio é prolongado ou a senhora de cima morreu sem
avisar
Tudo isso começa a inquietar-nos e a criar modelações nos dias de
calmaria
Tu sabes, tu conheces-me, para não ter que descrever tudo ao pormenor
Sabes quando eu adormeço porque não quero que a conversa se prolongue
Sabes das minhas técnicas de ilusão e sabes como a magia é um dos meus
refúgios
Sendo mais barato faço aparecer borboletas em vez de coelhos
E se alguém tem de desaparecer geralmente sou eu que me presto a tal
serviço
Tu ficas para ouvir os aplausos e nunca me contas das pateadas e dos
assobios
E foi assim que descobri como se fazem filtros com o amor
Preocupa-me que ainda não tenhas chegado a esta cadeira que fiz para ti
E logo te havias de atrasar no dia em que te queria surpreender
Que estranho é essa coincidência ser no preciso dia em que te ia falar ao
ouvido
Não queria que ninguém soubesse que coisas te digo quando te separo do
universo.
2 comentários:
Acho que sim, que o melhor é trocares estes dias com céus lamacentos por uma luz do candeeiro da secretária para
dares corpo a um poema. Venha ele donde vier.
Abraço do RM
Bem vindo às palavras da emoção, porque só elas estremecem as águas paradas e são mais belas do que os discursos construídos da razão.
Que os afazeres to permitam sempre.
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