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quarta-feira, outubro 10, 2007

Além Tejo, Além mar


O Alentejo da minha infância era muito parecido com o mar, um mar verde de espigas e o horizonte lá muito longe para descanso dos olhos. Talvez por isso, hoje, que me desterrei em terras sem verde e com o horizonte mutilado com nuvens de betão, precise do mar para relembrar a infância e das gaivotas para continuar a acreditar na liberdade. O céu da cidade, mesmo naquelas noites em que a lua se ausenta, tem muito menos estrelas que pirilampos havia no meu quintal. Abro a janela, e não sei se é por estar muito perto do céu, não consigo cheirar o tojo, nem o rosmaninho, apenas me chega o odor apressado do autocarro e dos fritos da vizinha de baixo. A lentidão dos rebanhos que apenas se moviam na sombra, as mulheres coloridas que atavam as saias nas pernas, a panela de barro que me iniciou aos paladares superlativos, tudo isso se some como um nevoeiro que acinzenta as cores da memória. Só o mar é grande como o Alentejo da minha infância. Os barcos singulares riscando caminhos com chaminés e fumo são os montes onde o sol do entardecer gritava na brancura da cal. E os bandos de pássaros e as majestosas cegonhas regressavam como regressam as gaivotas a terra firme e conhecida. Nadar é como caminhar seara dentro e na pele o sal marca os mesmos caminhos que as farpas das espigas deixavam. O meu além tejo é agora o meu além mar, paixões paralelas que sei tocarem-se no infinito da minha infância.

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